8 de mar. de 2012

Receita de Mulher

Esse poema de Vinícius de Moraes descreve como toda mulher deve ser, pode parecer um pouco chauvinista para algumas feministas, porém para as que são e gostam de ser femininas ela é perfeita para um dia como hoje, em que o mundo inteiro decidiu dedicar a mulher.
Sou obrigada a confessar que 'estou indo no embalo', porque não gosto de "Dia Internacional da Mulher", simplesmente porque essa data me soa mais preconceituosa do que enaltecedora;   detesto quando me dizem 'parabéns pelo Dia da Mulher', eu não agradeço e faço questão de logo dizer que ' acho isso tudo uma baboseira' e que  sou mulher todos os dias e faço questão de deixar isso bem claro a todo instante. 
Gosto de tentar seguir essa receita que Vinícius elaborou, simplesmente porque como homem, ele só podia deter-se no físico e no mistério, porque o instinto feminino nem mesmo o grande 'Poetinha' foi capaz de compreender...
Mulheres, parabéns para nós... Todos os dias!


As muito feias que me perdoem, mas beleza é fundamental. 
É preciso que haja qualquer coisa de flor em tudo isso, qualquer coisa de dança, qualquer coisa de haute couture em tudo isso (ou então que a mulher se socialize elegantemente em azul, como na República Popular Chinesa).
Não há meio-termo possível. 
É preciso que tudo isso seja belo. 
É preciso que súbito tenha-se a impressão de ver uma garça apenas pousada e que um rosto adquira de vez em quando essa cor só encontrável no terceiro minuto da aurora.
É preciso que tudo isso seja sem ser, mas que se reflita e desabroche no olhar dos homens. 
É preciso, é absolutamente preciso que seja tudo belo e inesperado. 
É preciso que umas pálpebras cerradas lembrem um verso de Éluard e que se acaricie nuns braços alguma coisa além da carne: que se os toque como no âmbar de uma tarde. 
Ah, deixai-me dizer-vos que é preciso que a mulher que ali está como a corola ante o pássaro seja bela ou tenha pelo menos um rosto que lembre um templo e seja leve como um resto de nuvem: mas que seja uma nuvem com olhos e nádegas. 
Nádegas é importantíssimo. 
Olhos então nem se fala, que olhe com certa maldade inocente. 
Uma boca fresca (nunca úmida!) é também de extrema pertinência.
É preciso que as extremidades sejam magras; que uns ossos despontem, sobretudo a rótula no cruzar das pernas, e as pontas pélvicas no enlaçar de uma cintura semovente.
Gravíssimo é porém o problema das saboneteiras: uma mulher sem saboneteiras é como um rio sem pontes. Indispensável.
Que haja uma hipótese de barriguinha, e em seguida a mulher se alteie em cálice, e que seus seios sejam uma expressão greco-romana, mas que gótica ou barroca e possam iluminar o escuro com uma capacidade mínima de cinco velas.
Sobremodo pertinaz é estarem a caveira e a coluna vertebral levemente à mostra; e que exista um grande latifúndio dorsal!
Os membros que terminem como hastes, mas que haja um certo volume de coxas e que elas sejam lisas, lisas como a pétala e cobertas de suavíssima penugem no entanto, sensível à carícia em sentido contrário.
É aconselhável na axila uma doce relva com aroma próprio apenas sensível (um mínimo de produtos farmacêuticos!).
Preferíveis sem dúvida os pescoços longos de forma que a cabeça dê por vezes a impressão de nada ter a ver com o corpo, e a mulher não lembre flores sem mistério. 
Pés e mãos devem conter elementos góticos discretos. 
A pele deve ser fresca nas mãos, nos braços, no dorso, e na face, mas que as concavidades e reentrâncias tenham uma temperatura nunca inferior a 37 graus centígrados, podendo eventualmente provocar queimaduras do primeiro grau. 
Os olhos, que sejam de preferência grandes e de rotação pelo menos tão lenta quanto a da Terra; e que se coloquem sempre para lá de um invisível muro de paixão que é preciso ultrapassar. 
Que a mulher seja em princípio alta ou, caso baixa, que tenha a atitude mental dos altos píncaros.
Ah, que a mulher dê sempre a impressão de que se fechar os olhos ao abri-los ela não estará mais presente com seu sorriso e suas tramas. 
Que ela surja, não venha; parta, não vá e que possua uma certa capacidade de emudecer subitamente e nos fazer beber o fel da dúvida. 
Oh, sobretudo que ela não perca nunca, não importa em que mundo, não importa em que circunstâncias, a sua infinita volubilidade de pássaro; e que acariciada no fundo de si mesma transforme-se em fera sem perder sua graça de ave; e que exale sempre o impossível perfume; e destile sempre o embriagante mel; e cante sempre o inaudível canto da sua combustão; e não deixe de ser nunca a eterna dançarina do efêmero; e em sua incalculável imperfeição constitua a coisa mais bela e mais perfeita de toda a criação inumerável.

Vinícius de Moraes


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